Overdose EngHaw

quarta-feira, 18 de junho de 2008

"preso no trânsito de astros imóveis
faço as contas na ponta do lápis
e nada faz sentido"


Pode-se pensar de início que esses versos não fazem sentido: ¿trânsito de astros imóveis? Seriam esses "astros imóveis" elementos do 'star system' de nossa sociedade de espetáculo? Não sei. Sigo em outro caminho com espírito de Parsifal: Kant, o grande iluminista alemão em sua crença imperturbável na razão, afirmava que nada lhe causava mais admiração do que ¿o céu estrelado sobre mim e a lei moral em mim?. Kant tendo como pressuposto a física de Newton, tentou pensar um conjunto de regras éticas que deveriam conduzir o homem em sua existência. A idéia era conseguir a mesma necessidade da física de Newton: assim com a lei da gravidade vale para todos os corpos, a lei moral deveria se impor a todos os seres dotados de razão. O grande problema estaria em como submeter a vontade humana a essas leis da razão.

Se Kant tivesse chance de ver o dano causado pelo fascismo/nazismo provavelmente seria mais cético quanto ao poder e sentido da racionalidade humana...

De qualquer forma, hoje não faz mais sentido pensar numa ¿ordenação cósmica? de valores imutáveis e eternos que possa orientar a vontade do homem. Como sabemos por Novos Horizontes o universo, segue-se em movimento, em expansão. A analogia entre o universo ordenado da física newtoniana e o formalismo da ética kantiana, fazendo ¿as contas na ponta do lápis?, não faz mais sentido. Provavelmente as referências do compositor são diferentes, mas acredito que esse primeira estrofe aponta para a ausência de uma racionalidade universal hoje... a letra segue...

"adrenalina é uma menina dormindo
dançando em silêncio imaginando um reggae
cansei de alimentar os motores
agora quero freios e airbag
pois nada faz sentido"

Essa segunda estrofe trataria das emoções. O tema é introduzido com a palavra ¿adrenalina?. Por um lado não faz sentido manter uma postura passiva, apática.. por outro, não faz sentido entrar no jogo dos ¿esportes radicais? buscando na promessa de aventura e velocidade sua dimensão mais destrutiva: ¿cansei de alimentar os motores/ agora quero freios e air bag?. No entanto, nada aqui faz sentido.

"se capricórnio fosse câncer, se Califórnia fosse França
a rampa que lança o skate ao céu seria nosso chão
180, 360, 540 graus, girando, esquentando
só pra ver até quando o motor agüenta o caos"

Se: entramos no universo da suposição. ¿Poderia ser o mundo diferente? Qual diferença a letra postula: a adrenalina do esporte radical estaria em nossa vida cotidiana como intensidade e não como desperdício e auto-destrutividade. Por isso o refrão anuncia:

"não vou ficar parado, não vou passar batido
se nada faz sentido, há muito que fazer"

Não deveríamos nos entregar a apatia e ao comodismo, nem nos deixar dominar pelas emoções (por vezes destrutivas): Se o mundo parece não ter sentido, devemos construir um sentido: existe muita coisa para fazer.

Isso é posto na canção como uma necessidade:

"não há alternativa, é a única opção
unir otimismo da vontade e o pessimismo da razão
contra toda expectativa, contra qualquer previsão
há um ponto de partida, há um ponto de união :
sentir com inteligência, pensar com emoção"

A única opção que temos estaria em seguir o exemplo de determinação dado pelo filósofo italiano Antonio Gramsci que, preso pelos fascistas e padecendo com diversas doenças, nunca se curvou diante da situação totalmente desfavorável, pelo contrário: no cárcere por dez anos, produziu de maneira incessante (o que resultou em mais de 4 mil páginas de um trabalho de filosofia política profundo e original). Tentando descrever o estado de animo que o cárcere lhe proporcionou Gramsci utilizou uma frase do escritor francês Romain Rollain, mostrando que trazia juntos ?o pessimismo da razão e o otimismo da vontade?.

O trabalho de Gramsci levou o marxismo a superar o determinismo econômico, o direcionando para uma transformação intelectual e moral da sociedade. Seria necessário ¿lutar? para construir uma nova cultura, um novo humanismo ¿com base na crítica dos costumes, dos sentimentos, das concepções de mundo, da estética e da arte? É no sentido dessa transformação que Gessinger repete:

"não vou ficar parado, não vou passar batido
se nada faz sentido, há muito que fazer"

Por: Marcos Carvalho Lopes, Jataí (GO) - Blogueiro do Overmundo

1 comentários:

Leonardo Daniel disse...

Gostaria de agradecer o belo texto poético e filosófico com um poema que já está completando 4 aninhos.

Engenharia Hawaiiana

Tudo começou logo no início dessa existência
Rock and Roll e sua mensagem de ambivalência
garotos do sul
pessoas e suas ilhas
várias formações
variáveis sintonias

O sul deixa de ser uma ilha
Num português universal
A Engenharia Hawaiiana
constrói seu legado
apagando da lousa o próprio mal
que sem querer a professora escreveu

Política? Filosofia? Existencialismo?
É isso e muito mais
pois o Humberto refaz
o que foi feito e cria o novo
a partir de sua poesia
é o arquiteto do seu poema

Somos todos Dom Quixotes
com nossos dilemas
a Engenharia Hawaiiana
será sempre a mesma?
Tomara que não
e nós mesmo sendo outros
e ela diferente de si mesma
possa entrar no nosso coração


Leonardo Daniel
05/09/04