Entrevista feita por Por Welbert Rabelo do site suaturma.com em Brasília/DF, 06/01/2004.
O baterista Carlos Maltz foi o fundador e um dos principais compositores dos ENGENHEIROS DO HAWAII, ao lado de Humberto Gessinger. Após a sua saída da banda gaúcha em 1997, o músico se afastou para se dedicar à sua família e astrologia, que é sua principal profissão na atualidade, na capital federal. Em 2003, ele voltou à cena musical, através do lançamento do ótimo trabalho, Farinha do Mesmo Saco, o qual contou com participações especiais e ilustres de Humberto Gessinger e Zé Ramalho. A nossa equipe aproveitou a oportunidade para ter um agradável e descontraído bate-papo exclusivo com Carlos Maltz, que nos conta um pouco sobre o seu primeiro disco solo, seus projetos pessoais, pirataria, internet, drogas, religião e muito mais...
Welbert Rabelo:Primeiramente, o que você passou a fazer após a sua saída dos ENGENHEIROS DO HAWAII?
Carlos Maltz: Eu já estudava astrologia e, quando parei de trabalhar nos ENGENHEIROS DO HAWAII, comecei a dedicar a essa nova área. Eu acabei deixando um pouco de lado a música profissional, apesar de estar fazendo algumas coisas por fora. Agora, por exemplo, estou indo para Curitiba para produzir uma banda de rock. Então, esse lance de música agora é mais para escapar um pouco daquele núcleo do showbizz, pois a minha principal atividade hoje é a astrologia. Para você ter uma idéia, eu tenho um consultório e atendo as pessoas.
Welbert Rabelo:Acho legal você produzir as bandas que estão começando. Em Brasília, o Philippe Seabra (PLEBE RUDE) também está dando uma força e andou produzindo alguns conjuntos, como 10ZER04, BOIS DE GERIÃO e PHONOPOP, dentre outros...
Carlos Maltz: Na verdade, eu não estava produzindo muito, mas fui convidado e acabei aceitando em produzir essa banda de Curitiba. Antes, cheguei a fazer duas produções. A maioria dessas bandas foram criadas por fãs dos ENGENHEIROS DO HAWAII e eles ficam nos pedindo para ajudar. Então, resolvi encarar tudo de frente. Fiquei um tempão morando no meio do mato, aqui perto do Vale do Amanhecer, pois não queria ter mais nenhum contato com esse tipo de coisa. Mas um dia teve um cara que foi me procurar lá no meio do mato. O fato dele ter ido lá me fez ver tudo com outros olhos. Eu acabei vendo que não dá para se livrar desse tipo de coisa. Afinal, chegamos a cativar e entrar no coração de muitas pessoas, o que nos dá uma certa responsabilidade por isso. A partir daí, voltei à ativa, montei um site, passei a me relacionar com essas pessoas, gravei o disco Farinha do Mesmo Saco e o estou vendendo pela internet. Com isso tudo, voltei a fazer contato com os fãs novamente, pois estava fugindo deles antes (risos).
Welbert Rabelo:Como surgiu a idéia de compor e lançar o seu primeiro álbum solo?
Carlos Maltz: Surgiu desde a visita daquele cara à minha casa no meio do mato. Ele ouviu algumas músicas minhas no violão e falou que eu tinha que lançar um disco. Então, fiz um acordo com ele: “Tudo bem. Eu gravo um disco e você faz um site” (risos). E, assim aconteceu. Eu gravei o disco e ele fez o site, já que ele é webmaster. A página era www.carlosmaltz.com.br e agora está se transformando em www.maltzonline.com.br.
Welbert Rabelo:Porque o título Farinha do Mesmo Saco?
Carlos Maltz: Ele foi tirado da música “Farinha do Mesmo Saco”, que diz (já cantando): “Há cento e cinqüenta mil anos atrás. No colo da Mãe África. Éramos todos negros. Sem dinheiro e sem pátria. Uns foram pro norte outros foram pro sul. Esqueceram do vovô macaco. Mas somos todos Farinha do mesmo saco. Nós somos todos Farinha do mesmo saco”. Ela é uma composição que veio de um sentimento de raiva, quando li uma reportagem na revista VEJA, onde falava que a Ciência de hoje já tinha a capacidade de saber qual porcentagem de brancos e pretos que a pessoa é. Eu fiquei com muita raiva e fiquei uns 6 dias assim. Se encontrasse o cara que escreveu aquilo, era capaz de agredi-lo. Ora, vivemos numa situação tão difícil!!! Podemos, por exemplo, até ver um colapso de níveis irreversíveis na ecologia em todo o mundo!!! Então, ver aqueles caras gastando tempo e dinheiro para falar sobre quantos por cento tem de branco e preto em nós, realmente me deixou revoltado!!! Para me livrar daquele sentimento, escrevi esta música, que acabou virando o título do CD.
Welbert Rabelo:De cara, apesar de simples, a capa do álbum chama logo à atenção, pois nos faz lembrar uma embalagem de aveia QUACKER!?! De quem foi a idéia para concepção desta arte?
Carlos Maltz: Fui eu mesmo. Eu assisti uma entrevista de um ex-soldado alemão que que estava na batalha do Monte Castelo. Ao responder uma pergunta sobre como ele sabia a diferença entre um ataque americano de um brasileiro, ele disse que os americanos, quando jogavam uma bomba, ela caia a 200 metros, outra a 180, a 160, a 140 metros até acertar o alvo. Quando era os brasileiros, era apenas uma bucha só!!! Obviamente porque o nosso arsenal era muito menor que a dos americanos. Então, quando estamos nesse lance de ser independente, só temos uma bucha só. Se vamos fazer alguma coisa, seja uma camiseta, seja uma capa de CD, tudo tem que ter um impacto só, exato e muito profundo. Quando fiz essa capa, eu a coloquei no site para as pessoas votarem sobre o que achavam dela. A pesquisa consistia nas alternativas: "genial", "boa", "mais ou menos" e a última delas era "fala sério"... (risos). O engraçado é que as opções mais votadas foram "genial" e "fala sério". O Anderson achou a capa horrível. Mas, eu expliquei para ele que a capa conseguiu transmitir aquilo que eu queria mostrar sobre a volta à pureza e à simplicidade do rock, exatamente como eu queria mostrar na minha música também.
Welbert Rabelo:Apesar da sua saída dos ENGENHEIROS DO HAWAII, você participou de alguns trabalhos da sua ex-banda, inclusive no excelente último trabalho Campo Minado. Agora, no seu trabalho solo, o Humberto Gessinger teve uma participação efetiva, onde não só tocou guitarra, baixo, violão, como também cantou nas faixas “Quase Uma Oração” e “Depois de Nós”, esta última com uma sonoridade que nos remete ao seu ex-conjunto. Como foi que rolaram estas participações?
Carlos Maltz: A primeira participação aconteceu na música “Farinha do Mesmo Saco” e acabamos fazendo o disco todo juntos. Quando eu falei com o Humberto que queria gravar um disco, ele se ofereceu para produzir. Eu concordei, mas ele teria que produzir e tocar. Então, na verdade, era eu, ele e o estúdio (risos). Fizemos tudo sozinho e foi uma experiência bastante legal. Tocamos juntos depois de tantos anos e sem aquele esquema todo que tinha na época dos ENGENHEIROS DO HAWAII que envolvia muito dinheiro para muitas pessoas. A partir do momento que isso acontece com uma banda, aquela simplicidade, aquela pureza do começo da proposta se perde um pouco. Eu acho que, de certo modo, eu e o Humberto nos conhecemos de novo, resgatando aquele sentimento que tínhamos quando começamos a tocar em Porto Alegre. No começo não tínhamos pretensão de ficarmos famosos ou de ganhar dinheiro, nem nada disso. A gente nem sabia que tudo isso iria acontecer com os ENGENHEIROS DO HAWAII. Nós tocávamos era por prazer mesmo. O álbum Farinha do Mesmo Saco acabou registrando um pouco deste sentimento. Depois, acabei sendo convidado para participar no último disco dos ENGENHEIROS DO HAWAII e acho que conseguimos levar um pouco dessa leveza, de tocar por prazer, para dentro da banda dele. Os ENGENHEIROS DO HAWAII já está na estrada há tantos anos, com uma outra condição, com músicos contratados. É uma outra energia que rola ali, pois agora é uma banda mais burocrática, mais formal. Então, acho que conseguimos levar um pouco dessa vibração, dessa simplicidade que existia no começo da carreira dos ENGENHEIROS DO HAWAII.
Welbert Rabelo:Outra momento interessante foi a participação de ZÉ RAMALHO, que, além de escrever “Jardim das Acácias”, participou na faixa “Passos do Mundo”. Foi legal contar com ele no disco? Conte-nos um pouco sobre essa participação...
Carlos Maltz: Antes tenho que explicar uma coisa. Eu recebo muitas cartas e mensagens de fãs questionando sobre a minha saída dos ENGENHEIROS DO HAWAII, o que é normal quando a gente sai de uma banda. Eu nunca vou responder e nem tenho saco para escrever a mesma coisa para várias pessoas. Eu sou fã do ZÉ RAMALHO e acabei mandando uma carta para ele um dia. Através dela, acabei conquistando a oportunidade dele participar do meu CD. Ele, também, deve receber muitas cartas iguais, mas escrevi dizendo que era fã do seu trabalho e do impacto que sua música teve em minha vida, pois ele foi o responsável para que eu me tornasse músico. Em 77, quando assisti um show dele no Rio em Ipanema, pela primeira vez, foi uma oportunidade de ver a possibilidade de se fazer uma música em português, viajando num universo metafísico, o que não tinha na música brasileira na época. Eu ouvia e era fã do PINK FLOYD e eles faziam este tipo de música. O ZÉ RAMALHO mostrou que era possível fazer isso com a música brasileira.
Welbert Rabelo:O temas do álbum Farinha do Mesmo Saco são bastante interessantes e falam sobre vida espiritual, astrologia, reencarnação e até sobre Ets, dentre outras coisa. Fale um pouco sobre o seu processo de composição e a concepção deste disco...
Carlos Maltz: O meu processo de composição não é algo regular. Cada música se apresenta de uma maneira e um momento diferente. A música “Farinha do Mesmo Saco”, como eu já disse, veio de um momento de raiva. Eu faço música é para mim mesmo. Eu escuto esse disco até hoje. Eu faço música que estou afim de ouvir o que não tem por aí e que atenda as minhas necessidades como músico. As minhas músicas refletem aquilo que eu vivo no dia a dia. Não tem diferença do que eu sou do que estou falando em minhas músicas. Eu não tenho paciência para artistas que cantam uma coisa e vivem outra fora. Acho isso algo ultrapassado e não tenho interesse nesse tipo de coisa. Qualquer um pode falar qualquer coisa, mas eu quero saber o que o cara está vivendo. E isso, não vale só para música não!!! Vale para religião, vale para filosofia de vida, vale para partido político. Eu quero saber como o cara vive as coisas que ele está falando. A arte é minha vida e não tem diferença entre o que sou e o que canto.
Welbert Rabelo:O álbum Farinha do Mesmo Saco é composto por 11 faixas e foi produzido e gravados por pessoas e anos diferentes. No entanto, a sonoridade ficou homogênea como um todo, o que deve ter dado um bom trabalho. Como foi trabalhar com tantas pessoas ao mesmo tempo?
Carlos Maltz: O engraçado é que não deu trabalho nenhum (risos). Quando você está sendo o que é durante as gravações de um disco, as coisas são bem simples e tranqüilas. Na verdade, você não precisa de nada, basta chegar e gravar. Assim foi quando gravei com o Humberto, pois não tivemos tempo para ensaiar. A gente não estava conseguindo se encontrar direito e, quando chegamos no estúdio, simplesmente gravamos. Então, se você inventar uma coisa que não é, com certeza terá bastante trabalho (risos).
Welbert Rabelo:Qual a sua avaliação da cena do rock nacional, comparando desde a sua fase nos ENGENHEIROS DO HAWAII?
Carlos Maltz: Hoje eu estou com 40 anos e tenho filhos para cuidar. Então, não estou muito por dentro do que está acontecendo, como era naquela época. Mas eu sinto falta de algumas coisas. Antes havia mais dignidade e tinha mais engajamento de idéias, que é uma coisa que está fora de moda e eu não entendo o porquê? Acho muito chato isso!!! Depois daquela fase de cinismo, onde quanto mais filho da mãe o cara fosse, era melhor, a coisa ficou muito estéreo, entende? A idéia foi banida não só do rock, mas da música em geral. Eu até fiz um texto à respeito chamado “O BUNDA-KARMA” (ler artigo na íntegra aqui), que fala do Karma que estamos vivendo por causa dos artistas “bundas”, que é o que gerou a pirataria musical. É desse cinismo, dessa falsidade e dessa picaretagem de alma que está presente no mercado. Muitas vezes, até os artistas de garagem também já estão pensando em agradar o mercado. Naquela época, quando começamos a tocar, não pensávamos em mercado. Estávamos preocupados em dizer o que pensávamos. É exatamente isso o que está faltando na música de hoje. Antes de pensarmos em mercado, temos que pensar em arte, que é a expressão do que está dentro de nós. Eu sinto muita falta disso. Acho que a arte virou um negócio de abrir as pernas muito rápido. Ela perdeu a virgindade muito cedo e perdeu a graça. A graça da arte está na virgindade. Se o artista for igual ao advogado porque precisar do artista? Então, eu sinto que é importante que não nos confundamos com os advogados!!! Nada contra eles, é claro!!! (risos).
Welbert Rabelo:Você curte alguma banda da atualidade?
Carlos Maltz: Eu curto o CPM 22. Eu não tenho nenhum disco deles, mas quando toca nas rádios, eu acho legal. Eu acho que eles têm uma coisa pessoal... têm uma coisa deles, entende? Eu gosto de bandas que falam algo deles e, mesmo quando não gosto do que eles estão falando, eu respeito. Os RAIMUNDOS é uma banda que eu respeito muito, embora acho que não tem nada haver o papo deles lá. Inclusive, já até arrumei briga com eles por causa disso. Mas eu os respeito muito, pois eles têm uma linguagem própria.
Welbert Rabelo:Falando em cena e em tantos anos de carreira, as suas influências musicais do passado ainda continuam as mesmas?
Carlos Maltz: As influências são as mesmas do meu início de carreira, PINK FLOYD e ZÉ RAMALHO. Na verdade, o que faz a gente ser músico ou ator é alguém que fez a nossa cabeça aos 14 ou 15 anos de idade ou talvez menos... Então, os caras que tocaram o meu coração, continuam sendo os mesmos. É claro que, com o passar do tempo, algumas influências passam a se agregar, mas as principais continuam sendo PINK FLOYD e ZÉ RAMALHO.
Welbert Rabelo:Além da nova tendência cada vez mais crescente das bandas e gravadoras divulgarem suas músicas pela Internet, percebe-se que as bandas independentes estão lançando discos com bastante qualidade. Qual a sua opinião sobre este novo contexto da música mundial?
Carlos Maltz: A internet é uma maravilha. Acho que é um dos maiores avanços que já tivemos na humanidade. Acredito que nós ainda nem começamos com esse negócio. Na verdade, o que temos hoje para a verdadeira rede é algo como era a carroça para o automóvel. Hoje estamos ainda ensaiando a verdadeira rede, que é quando a humanidade virar uma só como resultado de uma sociedade. A internet é uma coisa revolucionária. Nós vamos ver um universo muito maior do que estamos vendo hoje, com o lance dos direitos autorais e os MP3. Eu acho que a pirataria é algo extremamente saudável. Por isso, eu fiz o texto “O BUNDA-KARMA” que é uma forma para você acabar com a pirataria. Aliás, para você acabar com a pirataria é algo bastante simples. Basta as gravadoras cumprirem com sua obrigação de produzir, gravar e distribuir música. Se toda gravadora fizesse isso, acabava com a pirataria. Como é que os artistas alternativos conseguem sobreviver? Ninguém sabe como... Eu, por exemplo, para a pessoa comprar um disco meu tem o maior trabalho, pois tem que depositar o dinheiro numa conta que ela nem sabe se é minha mesmo. Mas o cara vai lá, deposita. Depois, eu envio o CD para ele. Então, vejo que poucas pessoas estão copiando este CD. Há um sentimento de solidariedade, envolvendo toda essa nova maneira de se fazer e distribuir música. A grande sacanagem da grande prostituta é que os artistas que entraram na onda das gravadoras perderam e, na hora que perderam, abriram espaço para o vírus da pirataria.
Welbert Rabelo:É verdade. Não vemos, por exemplo, bandas como U2, ECHO & THE BUNNYMEN, AC/DC, IRON MAIDEN, OZZY OSBOURNE ficarem preocupados com a pirataria...
Carlos Maltz: Exatamente!!! As pessoas querem comprar o disco verdadeiro dessas bandas, que são honestas e verdadeiras com suas músicas. Ao contrário dessa picaretagem que os caras colocam bandas na TV e vendem disco. Aliás, eu não sei qual é a relação entre bunda e música... (risos). Então, é aí que eu pergunto: “Você pagaria uns R$30,00 para levar para casa um BD (bunda-disc) que se deteriorará em 15 dias? Mas R$ 3,00 você paga, né? Porque é exatamente isso o que ele vale...".
Welbert Rabelo:Quais são os seus planos para 2004?
Carlos Maltz: Eu vou primeiro para Curitiba produzir uma banda. Eu tenho um projeto chamado “ROCK DE CARA LIMPA NAS ESCOLAS” (ver na íntegra aqui). Eu já realizo este projeto há um tempo. Agora, com o novo disco, estou desenvolvendo ele mais, tentando levar para outros Estados. O projeto é um talk-show, onde não só toco algumas músicas minhas, mas outras dos ENGENHEIROS DO HAWAII e de coisas daquela época e que eu gosto, como LEGIÃO URBANA, OS PARALAMAS DO SUCESSO, TITÃS e CAPITAL INICIAL; como também falo com a platéia, que me fazem perguntas e acabamos trocando algumas idéias. Eu acabo falando da minha própria vida e das coisas pelas quais eu passei, trazendo na ocasião coisas da nova espiritualidade. Então, é uma outra forma de falarmos de coisas espirituais, sem ser pelas formas caretas e tradicionais da sociedade. É uma nova maneira das pessoas se religarem a Deus. Eu me considero um divulgador disso, através do trabalho que eu faço. Eu considero essa nova forma muito importante, tendo em vista a balela que estão vendendo para a juventude, especialmente na questão das drogas. Eu baixo o cacete nesse negócio, falando a respeito da maconha: O quê que é? Como é que ela funciona? Falo também da minha experiência com ela e dos estudos dos médicos, psiquiatras e espirituais sobre a maconha. Você vê muita gente falando sobre a legalização e liberação da maconha, mas você não vê ninguém debatendo o assunto da maneira correta. Quando você vê alguém debatendo o assunto é de forma emocional, seja favor ou contra. Eu não quero saber do emocional. Eu quero saber é o que aquele doutor que estudou a maconha tem a me dizer ou o que o cientista que estuda a mente possa me dizer: Como a mente humana é? Aonde está a mente humana? São esses detalhes que estou querendo levar para as escolas de várias cidades.
Welbert Rabelo:Durante as suas apresentações, quais são as músicas do álbum que têm uma maior receptividade pela platéia?
Carlos Maltz: “Farinha do Mesmo Saco” é uma que tem uma boa receptividade. “Quase Uma Oração” é outra que as pessoas pedem muito para tocar e acabou sendo o maior sucesso do disco. Aliás, este disco foi bastante elogiado, o que me surpreendeu bastante. Eu pensava que ele seria massacrado pela crítica, mas foi eleito um dos melhores lançamento do ano pela MTV. Vários sites de rock também deram críticas positivas. Então, fui bastante surpreendido mesmo, já que é um disco que fala de Deus.
Welbert Rabelo:Já que estamos falando em shows, no caso de ENGENHEIROS DO HAWAII, nem sempre uma banda que fica muito tempo na estrada não vive só de bons momentos. Durante o período em que você ficou no conjunto, você se lembra de alguma situação engraçada ou constrangedora que entrou para a história dos bastidores do grupo?
Carlos Maltz: (já rindo)... Cara, a nossa história só tinha momentos hilários e essa era uma característica da banda. Por exemplo, quando fomos tocar na antiga União Soviética, toda a viagem foi hilária. O cara que nos contratou nos escolheu por um catálogo. Ele fez contato com nosso empresário e queria saber as condições para irmos tocar lá. O nosso empresário cobrou um preço absurdo para ele não topar, só que o cara topou e acabamos indo para lá. Afinal, era um contrato milionário (risos). Chegamos lá e fizemos vários shows, sem divulgação nenhuma, onde cada um tinha uma novidade diferente do que o outro. Na verdade, eles faziam um pacote de shows na época, com 5 sessões por dia em um local tipo teatro. A gente nunca sabia o que iria acontecer, pois quando tocávamos havia uma cortina que ia abrindo. Eu me lembro em uma das apresentações em que, antes de abrirem a cortina, a gente já estava começando a mandar a ver no rock e, de repente, estávamos diante de uma platéia que só tinha velhinhas de 60 a 80 anos (risos). Não quisemos nem saber, era a época do Alívio Imediato e mandamos o cascalho ali (risos). Depois, em outra sessão, acho que das duas, só tinham soldados. Quando a gente já estava traumatizado, na sessão das 5, só tinha garotinhas, loirinhas e maravilhosas de 16 anos de idade. Foi uma experiência incrível, pois cada show era uma situação completamente diferente. Eles distribuíam os ingressos para as cooperativas e, por isso, cada apresentação era tão diferente e com platéias tão específicas. Depois, o lance do dinheiro, até o último dia a gente ainda não tinha recebido e íamos viajar no outro dia à noite. Então, o cara chegou com um saco de dinheiro e, em vez dele pagar a gente em dólar, nos pagou em rubro. O pior é que a gente não podia fazer nada com aquilo. Não tinha câmbio e se tentássemos trocar, ficaríamos sujeitos a não sei quantos anos de trabalhos forçados na Sibéria. Para você ter idéia, a grana dava para comprar o teatro onde tocamos. Não dava para comprar nada porque não se podia sair com nada de lá. Acordamos numa segunda-feira como umas das pessoas mais ricas da Rússia, com um saco de dinheiro nas mãos e não conseguimos comprar nada lá. Então demos o dinheiro para nosso intérprete lá que deve estar gastando o dinheiro até hoje (risos).
Welbert Rabelo:Para terminar, o espaço está aberto para uma mensagem aos fãs ou mesmo para as suas considerações finais...
Carlos Maltz: Não é que se possa ganhar dinheiro com a música. Eu já ganhei muito dinheiro com música. Mas não podemos fazer música com esse pensamento, pois o dinheiro é uma conseqüência e não uma causa. Se você quer ganhar dinheiro, vai ser advogado ou médico. Quem quiser entrar na música tem que olhar seu coração e ver se é isso mesmo que você quer fazer, pois é uma vida de sacrifício e dedicação. Você tem que ver é que nós é que vamos nos dedicar para a música e não é ela que vai dar para nós, não!!! Nós é que vamos dar a nossa vida para ela. Se você quer entrar na música e não quebrar a cara, vai por esse motivo, pois o resto, depois, é conseqüência.
ENTREVISTA: Welbert Rabelo.
Brasília/DF, 06/01/2004.